terça-feira, janeiro 31, 2006

Refúgio



Ouço a sonoridade do piano. Instrumento que me despoleta angústias, notas límpidas arrancadas do fundo da alma. Fluidez sonora solene que me faz render às emoções mais bem escondidas, no baú empoeirado e soldado na abertura, estrangulado por mil correntes de aço, rodeado por sensores de movimento, fechado num cofre de titânio, com código indecifrável, com reconhecimentos de voz e impressão digital. Rodeado por um batalhão de árabes com bombas à cintura e um lança-chamas ao ombro.
A doçura com que a melodia nos acaricia o cérebro e, talvez o âmago de um ser, cria uma sensação de conforto e de desenquadramanento de tudo o que é palpável. É a arte mágica de num segundo nos amansar a ansiedade, e logo num outro espicaçar-nos o desespero, até então adormecido.
Dá-nos o único mundo onde podemos ser verdadeiramente felizes, indicando-nos o canto recôndito e inabitado da nossa essência onde tudo é possivel. Apenas ilusão, na realidade. Um refúgio apelado pelas almas penadas, corpos mutilados que sofrem pela amputação dos seus membros.
Só na música o sangramento estanca e cicatriza.

domingo, janeiro 29, 2006


"Que dias há que
na alma me tem posto
Um não sei quê,
que nasce não sei onde
vem não sei como
e dói não sei porquê."
Luis de Camões

Fada Azul




Pequeno boneco de madeira,
Porque choras?
O que te amedronta?


Apazigua os teus receios.
Não és diferente...
És especial.


Deixa-os apontar,
Eles ignoram a dor alheira.


Olha para mim...
Não endureças o peito ainda mais
Do que aquilo que és feito.


O quê?

E arrependes-te?


Então levanta-te doce criatura,
E caminha forte e sereno.
Creio que aprendeste a lição.
E amanhã serás um menino de verdade!

terça-feira, janeiro 24, 2006

Pousio


"Não, não é Cansaço ...
É uma quantidade de Desilusão
Que se me entranha na espécie de Pensar,
É um Domingo às avessas
De Sentimento,
Um feriado passado no Abismo ...!"
Álvaro de Campos

sexta-feira, janeiro 20, 2006

MIM



Pensamentos acabaram de me atrofiar a concentração. Resignei-me. Não dá para tentar fixar os olhos em palavras sublinhadas a marcador fluorescente, enquanto estou em qualquer outro sítio menos sentada à secretária.
Mais uma das muitas vagas de nevoeiro que me toldam os sentidos. A mesma dormência já conhecida, tão familiar minha que se tornou companheira na luta diária. Só eu e ela. A minha sombra que se incidiu em mim mesma, tapando-me dos raios diurnos que me inebriavam... Tomara eu desistir de tudo isto, largar tudo, mudar o cartão de memória e seguir para além das fronteiras por mim impostas.
É tão estúpido tentarmo-nos cegar a nós próprios! É quando a visão toma a sua maior resolução. Mas tem mesmo de ser!
Engolirmo-nos, trazendo de arrasto tudo o resto adicionado, em virtude de outrém. Vêr alguém sorrir e retribuir o sorriso, mas por dentro só apetecer destruir, mutilar, rasgar a realidade em mil pedaços e incenerar num momento aquilo que levou sete dias a ser construído.
Estarei a ser falsa? Se o estiver a ser é pela simples tentativa de preservar os outros de mim própria. E vejo-me a rir, muitas das vezes, ironicamente de traço sarcástico e vice-versa. E tenho consciência que transparece tudo menos alegria e felicidade espontâneas. Mas é a única maneira de estancar as lágrimas, sempre tão desnecessárias e inutilmente estúpidas e ineptas. A máscara ajuda-me a filtrar não a informação que assimilo, mas a que emano para o exterior. Por mais que queira, já não a consigo tirar. A única vantagem é as afrontas que ainda estarão para chegar que, ao baterem na casca dura, só fazem ricochete, independentemente em quem acertar. E, muito sinceramente, prefiro nem saber. Eu avisei.
É uma das muitas explicações que arranjei para aqueles que muitas vezes me perguntam o Porquê? e o Como?, e eu respondo com o Até quando?.
A Raiva alimenta-me os sonhos e os pesadelos.
Fomenta-me projectos e angústias.
Sedimenta-me o futuro e corrói-me o passado.
Torna-me implacável em actos e auto-destrutiva em pensamentos.
E tudo porquê?
Represento para mim própria. Não porque tenho prazer em fazê-lo, mas para me esquivar às investidas assoladoras e multidireccionais de qualquer coisa que me é desconhecida. E tão grata por isso estou que me apetece distorcer aquilo que me é realmente verdadeiro.
ALGUÉM QUE ME EXPLIQUE A PIADA DE VÊR AS PESSOAS A DAREM COM A CABEÇA NA PAREDE? Sim, porque uma vez que é tão divertido, também me queria rir. E ver se sai verdadeiro!!


Não quero fazer guerra Contigo, mas se eventualmente me preparares mais alguma, juro pelo santo nome que Te foi dado, que não Te vai agradar muito a minha reacção.

Posto isto, aguarda...

terça-feira, janeiro 17, 2006

Insónias

Ter vontade de escrever e não conseguir espremer o miolo para as teclas. Tanto assunto para abordar, mas ao mesmo tempo nada que valha realmente a pena salientar, pelo menos às 3 da manhã. Vejo o cursor a bater o pé de impaciência, pressionando-me ainda mais pelo facto de não me encontrar capacitada da fluidez habitual. Pisca, pisca, pisca... nada! Isto torna-se hipnotizante. Experimentem em casa!
Vamos pôr música para vêr se impulsiona o escoamento das ideias.
Pronto.
Estou culada! Que grande merda, hã?
Um cigarro pode ajudar a dilatar as articulações mentais...
Saltou agora uma janela amiga.
Opah! Mais um membro para o blog da ramboiada! Algo me diz que aquele ainda vai dar muito que falar! Não sei qual de nós é pior! Que junta!
Credo, preciso mesmo de dormir! Mas a consciência da existência de um exame no final da semana não me tranquiliza. O cadeirão!
Desisto... rendamo-nos às evidências.
Dormir!

segunda-feira, janeiro 09, 2006

"Aquilo"



Faço uma pausa durante uns momentos. Acabada de chegar de mais um exame que, apesar de me ter corrido bem, deixou-m a 60%. Telefono a amigos com o intuito de desencantar apontamentos para o de amanhã e paro c os olhos no computador. Um nick chamou-me a atenção. Fique assim vidrada durantes uns momentos e tive vontade de abanar aquela cabeça desorientada que põe problemas onde não os há! Oscilações temperamentais que fazem perder o Norte, questões existenciais inerentes à condição humana, dúvida em tudo aquilo que existe e que não existe, vontade de gritar para o céu com esperança de que alguém nos oiça, convencermo-nos de que ninguém nos entende, vermo-nos numa solidão repentina, num ponto sem retorno, num beco sem saída. A falta de algo que ninguém nos pode dar, futuro incerto e indeterminado, receio do que se avizinha, desespero calado, sentir que falta uma peça em nós, necessidade de nos darmos a uma pessoa de uma forma diferente até então, ânsia de atingir os picos da glória e do sentimento ideal, o transcendental, vulgo, e passo a expressão, “coiso” porque não há definição ainda descoberta que traduza “aquilo”, e muito provavelmente nem irão descobrir.
Querendo eu elaborar um texto pouco lamechas... mas como sabemos é inevitável! Nada disso me é estranho, mas coloco-te as mãos nos ombros, e amparo-te o cambalear e não penses de forma nenhuma que te encontras sozinho.
As músicas que ouves, os casais que passam pela rua, as coisas que lês, desavenças amorosas, a ânsia de beber o elixir da vida: uns dias a revolta, outros a apatia. Sou das primeiras pessoas a dizer-te que não vale a pena fazer birra connosco mesmos. Daqui a uns anos vais olhar para trás e vais-te rir do que sentes agora, vais pensar “demorou, mas chegou”. Sim, porque todos nós acreditamos piamente que, como excelente rapaz que és, serás feliz pela simplicidade de que és dotado, muito mais do que alguma vez foste outrora. Tenho fé que isso seja passageiro, porque pior que isso é ter tido e não ter apertado contra peito para não fugir, com medo que o vento o leve. Apertado demais talvez, acabou por abafar. Talvez não percebas onde quero chegar, nem aquilo que te estou a dizer, mas só quero tenhas bem ciente nessa cabeça que estamos aqui.
Como é bom dizer que os amigos são tudo o que uma pessoa pode desejar, como de facto se verifica. Mas antes deles, estamos nós. Tens de pensar mais em ti, pensar que não é só e apenas “aquilo” que devemos aspirar. O ideal mais pretendido de toda a humanidade de facto. 90% das músicas falam “d’aquilo”, livros que descrevem “aquilo”, novelas que banalizam “aquilo” que só me dá vontade de corrê-los a todos ao biqueiro, poemas, quadros, filmes. Pessoas que falam de boca cheia, que empregam a terminologia tão imundamente usada e gasta... E nem um terço delas sentiu, sente ou irá sentir aquilo que banalizam. Por isso é que te peço, para te acalmares. Há coisas que não pudemos fazer com as nossas próprias mãos. Coloca o teu destino em algo que tenha a capacidade de mexer nos cordelinhos e que te possa favorecer de alguma forma.Não podemos fazer nada.
É aflitivo, mas temos de esperar.